ARTIGO REVISTA COACHING – PAULO MONTEIRO
Yuval Harari, em seu excelente best seller Sapiens, argumenta que o que fez a nossa espécie prevalecer sobre outras, é precisamente sua capacidade de contar histórias e acreditar nelas para construir nossas vidas e culturas.
Alguns filósofos epistemológicos argumentaram ao longo dos anos que a linguagem vem antes que a realidade, ou seja, linguagem cria mundos. Kant já tinha provocado com atrevimento que não temos como conhecer a “realidade” já que ela sempre passará por nossos filtros. E assim parece ser mesmo: criamos nossos mundos a partir do que pensamos e compomos simbolicamente, apesar de que uma certa “realidade” parece influenciar também nossos conceitos. Seria um movimento de mão dupla, mas na hora de criar nossos contextos, é o nosso pensar aliado a concepção de símbolos e histórias, que modelam nosso fazer, que por sua vez constrói nossos mundos.
Por isso é tão importante trabalhar a narrativa da própria história no processo de coaching. Quando o coachee narra sua história está atualizando seu existir no mundo, ressignificando sua trajetória com suas lentes e modelos mentais atuais. E isso é estimulante! Ao dar um novo sentido a sua vida a partir de seu momento atual, ele está também abrindo novas possibilidades.
Este fenômeno vem a confirmar o principio do existencialismo, concebido por Sartre, Camus e outros pensadores, que defendiam que o ser humano se faz a partir de sua vontade individual, sua intenção e seu fazer. Heidegger também enriqueceu esse principio ao cunhar seu termo Dasein, que significa o “ser sendo”, ou seja, o ser que vai se fazendo momento a momento. A cada ato do pensamento, da linguagem simbólica e do fazer que se desprende destes, a identidade do indivíduo vai se completando, ampliando, ganhando novas formas.
Então, ao contar sua história o coachee vai atualizando sua vida, descobrindo novas facetas que não tinha pensado ou conectado, e o mais interessante, abrindo novas portas que não tinham sido pensadas antes. A narrativa então, é dinâmica e atemporal, se atualiza num constante presente que por sua vez projeta amplos futuros. A linguagem, então, se transforma em útero fértil que engendra novos mundos.
Cabe ao coach, portanto, preparar o espaço adequado para que o coachee seja capaz de narrar sua própria saga, em primeira pessoa, como o protagonista da mesma, juntando o passado com o presente ressignificado, para assim, projetar o futuro que deseja ou consegue visualizar. E esta dinâmica se realizará num movimento cíclico: o futuro se tornará um novo presente, o presente se tornará passado, e o passado, quem sabe, poderá reconfigurar-se em um novo futuro.