O Metaverso tornará irrelevante a ideia central da filosofia do gênio Platão. Lembrando a principal alegoria que ele criou, a parábola da caverna: prisioneiros acorrentados passam a vida vendo a sombra de objetos que se movem atrás deles onde há um fogo que projeta a silhueta na parede. Um dia um prisioneiro escapa, sai da caverna, vê a realidade como é, iluminada pelo sol. Volta para contar aos colegas mas estes querem mata-lo porque ficou louco: chama de imagens o que para eles é real.
Essa narrativa é tão genial que ocupou as principais discussões filosóficas, psicológicas, sociológicas etc. do mundo ocidental. Foi até inspiração para filmes atemporais como Matrix, que teve seu 4º capítulo recentemente lançado. A metáfora de vivermos num universo virtual achando que é real, parecia atemporal. Até agora. Ela está a ponto de perder o sentido graças ao Metaverso. Este mundo paralelo está sendo projetado e divulgado para ser O Universo, onde a diferença entre real e virtual simplesmente deixa de ser relevante, afinal, o que é virtual num mundo que já é virtual? Dizer para minha afilhada de 7 anos que ela passa metade de seu dia num mundo virtual já não faz sentido pra ela. Os jogos e ambientes que ela vive através do celular ou tablet não lhe parecem virtuais, mas reais.
O Metaverso só exacerba isso, porque as pessoas morarão numa casa em Manhattan sem precisar sequer pisar lá. Namoros acontecerão no Metaverso, todos os tipos imaginários de encontros ocorrerão neste mundo paralelo, com avatares cada vez mais “humanizados”.
Recentemente vi Zuckerberg (que não tem tido dias bons) falando como uma criança feliz como é maravilhoso um mundo onde poderemos fazer o que quisermos sem sair do lugar, visitar todos os mundos e fazer qualquer coisa com nossos óculos virtuais. Ele quase se emocionou ao dizer que poderemos inclusive bloquear (cancelar?) uma “pessoa” (avatar) que acharmos inconveniente neste mundo que ele considera ideal.
Os fabricantes das tecnologias do Metaverso estão vibrando porque estão conseguindo aproximar ao máximo as expressões faciais verdadeiras aos “bonequinhos” avatares. É a Caverna que se aprimorou cada vez mais para não parecer nunca mais uma caverna. O Metaverso vem com a pretensão de tornar-se mundo real. Pelo menos isso é o que vemos nos brilhos dos olhos de seus criadores.
Eu prefiro ficar com o alerta do Harari que ainda vê coisas boas no Sapiens e seu mundo “de verdade”. Mas o Sapiens parece obstinado no seu desejo de ser Homo Deus.
Nenhuma dúvida das utilidades que o mundo virtual nos traz, mas esta pretensão de ser o “Universo” do Sapiens me incomoda porque gosto do mundo real.
Um dia me animei em pensar que o mundo virtual poderia estar “a serviço” do mundo real, mas a realidade mudou: o mundo virtual vira o real. Ponto. Me sinto como o Major Tom do clássico Space Oddity do gênio Bowie, que a milhares de quilômetros da Terra dizia: “planet earth is blue, and there’s nothing I can do”.